ALGUNS ASPECTOS DO PIB NO 3º TRIMESTRE/2017
Antonio Everton Junior
Economista
Com a medição realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), recentemente a economia brasileira reforçou os indicativos de que a recessão ficou para trás. Em linha com o que o mercado vem prevendo, o IBGE pode capturar a continuidade da recuperação no terceiro trimestre do corrente ano, sinal de que o desempenho do produto interno no exercício de 2017 poderá vir a ser positivo, ainda que relativamente baixo. Provavelmente feche entre 0,8% e 1,0%.
A maior constatação do comportamento favorável da economia do Brasil neste ano está na taxa de variação acumulada de 0,6% dos nove primeiros meses contra igual período de 2016. Esse indicador permite construir a imagem do nadador que estava debaixo d’água e agora consegue colocar a cabeça para fora e respirar com força.
A contrapartida negativa desse aspecto que leva ao otimismo apresenta-se quando, em vez da observação em nove meses, a comparação estende-se para 12. Ou seja, quando a taxa acumulada é dos últimos quatro trimestres contra os quatro imediatamente anteriores. Sem ajuste sazonal, o IBGE informa que o Produto Interno Bruto (PIB) ainda se encontra negativo, sendo -0,2% a taxa correspondente a esse período.
Nessa última forma de comparação, dois fenômenos se destacam: primeiro, o quanto o boom da agropecuária foi importante para reativar a economia; e segundo, esse setor apresentou-se como exceção, na medida em que todas as demais variáveis que compõem o PIB se mostraram negativas.
O que está por trás disso é a profundidade da crise. Assim sendo, enquanto a agropecuária cresceu 11,6%, os demais setores e agregados experimentaram queda: indústria (-1,4%); serviços (-0,8%); formação bruta de capital fixo (-4,2%); consumo das famílias
(-0,5%); e consumo do governo (-0,4%).
Ainda sob a avaliação do produto em quatro trimestres, há que se considerar o ajuste que o governo vem realizando nas suas contas a fim de alcançar a meta do déficit fiscal primário (R$ 159 bilhões). Outro aspecto interessante que afligia o mercado: a intensidade da contração do consumo das famílias (-0,5%).
Como o consumo das famílias se relaciona diretamente com inflação, crédito, confiança dos consumidores e mercado de trabalho e renda, numa perspectiva de tempo um pouco mais ampla tem-se ainda os indicativos de que a economia ia mal e que por causa da agropecuária começava a sair do atoleiro em que estava.
Isso porque o mercado de trabalho demorou a recuperar-se, fato observado com mais evidência a partir de abril do corrente ano. Em consequência, mais para a frente o consumo se eleva à medida que o emprego cresce.
Os sinais de melhora da atividade econômica como um todo ficam, portanto, limitados ao curto prazo, nas bases de comparação do trimestre contra o trimestre imediatamente anterior e frente ao mesmo período do ano anterior.
Dessa maneira, como a base de comparação trimestre contra trimestre anterior mostra sequência de resultados positivos, afirma-se que a economia nacional saiu da fase recessiva.
O gráfico 1 a seguir mostra a variação do PIB sob esse ângulo de comparação trimestral. Mais do que a tendência de arrefecimento do volume da atividade econômica na passagem do último trimestre (julho-setembro) contra o segundo deste ano, deve-se considerar mais importante o fato de o agregado haver crescido, na medida em que a economia vem se preparando para entrar no trimestre final do ano, e existem efeitos sazonais a considerar, uma vez que normalmente as vendas aumentam em dezembro e a economia passa a se aquecer poucos meses antes.
GRÁFICO 1 – PIB % – TRIMESTRE CONTRA TRIMESTRE ANTERIOR
Fonte: IBGE. Elaboração DE.
No trimestre julho-setembro contra abril a junho, o produto com ajuste sazonal (0,1%) foi capitaneado pela variável consumo das famílias (1,2%), cuja participação supera 60% do PIB, sob a ótica dos gastos dos agentes econômicos com o produto ofertado.
Apesar dessa boa notícia, uma outra pode ser considerada ótima e digna de registro. Após 15 trimestres de sucessivas quedas, finalmente a taxa do investimento produtivo (formação bruta de capital fixo) apresentou-se positiva (1,6%) – ainda que diante do mesmo trimestre de 2016 revele variação negativa de 0,5%. Essas variações revelam a tendência do investimento de crescer de maneira lenta e baixa, uma vez que a base de comparação de 2016 é muito fraca e negativa.
De alguma maneira vale observar que o investimento agregado tornar-se crescente significa que os empresários estão acreditando na retomada do desempenho positivo da economia e que as expectativas mudaram em relação aos cenários negativos de curto prazo.
Variável planejada, o investimento tem nas perspectivas e percepções futuras os fundamentos cruciais. Sensível em relação ao mercado financeiro, o investimento somente acontece se o retorno esperado for positivo e superior ao custo de capital da economia. Tendo no risco uma situação complexa e de difícil mensuração, muitas vezes as taxas de aplicação financeira são mais rentáveis. Boa parte da aversão ao risco é explicada pela atratividade da remuneração do mercado financeiro.
Outro elemento que se apresenta a favor da realização do investimento diz respeito à preparação para o atendimento das encomendas de fim de ano, cuja sazonalidade não merece ser desprezada – como já foi salientado. As expectativas das vendas no segundo semestre se constituem num combustível a mais para considerar os resultados das inversões produtivas.
Em linha com os acontecimentos do mercado, a taxa de investimento foi puxada pelo aumento e investimento da indústria de automóveis e pela aquisição de maquinário e equipamentos do exterior.
Preços subindo em menor velocidade do que no ano passado, juros com tendência declinante, sistema de crédito bastante acessível ao consumidor, mercado de trabalho em (re)aquecimento, consumidores com maior confiança na permanência do emprego e câmbio estável (nem barato nem caro) formam o conjunto de fatores que ajudam a justificar a mudança do sinal negativo para o positivo da taxa de formação bruta de capital fixo no curto prazo.
Convém dizer que o investimento em estágio crescente significa que as empresas estão apostando na manutenção da tendência de aumento da demanda. Porque a formação bruta de capital fixo tem a ver com expectativas dos empresários com relação a vendas futuras; se correlaciona inversamente com a taxa de juros; depende de um prazo de maturação da inversão produtiva; e cria condições futuras para que o nível de oferta agregada cresça, uma vez que se trata do estabelecimento de melhores estruturas físicas para a produção.
Enquanto alguns setores produtivos crescem em função do investimento, outros decrescem ? caso da construção civil, muito dependente do volume e do acesso ao crédito ofertado, do patamar de juros ao consumidor e da disposição das famílias em adquirir imóveis.
O setor da construção civil também é sobremaneira dependente dos gastos dos programas governamentais. Nesse aspecto, os ajustes feitos pelo governo afetam a quantidade de obras civis no País, diminuindo a oferta de moradias e aumentando a carência social. Por outro lado, cria-se espaço para oportunidades no mercado por meio da participação mais intensa dos investimentos do setor privado.
De fato, o governo vem se ajustando (-0,2%), se esforçando para evitar maior desequilíbrio nas finanças públicas. A continuidade da situação deficitária das contas públicas pode mais para a frente evidenciar riscos não esperados no momento – o crescimento exacerbado da dívida pública ?, além de exigir mais da sociedade para o equacionamento do desequilíbrio com a cobrança de mais impostos. Daí o menor volume de gastos em obras públicas, entre outros investimentos governamentais.
Ainda na comparação do último trimestre com o anterior, a agropecuária foi outro setor que pelo lado da oferta variou negativamente (-3,0%), apesar dos registros recordes ao longo de 2017, com a supersafra, e da excelente contribuição para que a inflação se posicionasse abaixo da meta.
O desempenho negativo do setor primário pode ser interpretado como ligeira acomodação das atividades primárias após crescimento surpreendente no primeiro semestre, em particular nos três primeiros meses do ano.
Além dessa ilustração, outra maneira de verificar o peso da contribuição da agropecuária na formação do PIB se tem pela variação de 9,1% do trimestre julho-agosto diante de igual trimestre de 2016, período de base fraca por causa do clima seco em algumas regiões e chuvoso em outras, mais o alto custo do crédito agrícola somado às dificuldades de diálogo entre ruralistas e governo.
Mais recentemente, graças às condições climáticas, à maior produtividade da terra, ao crédito mais fácil e à melhora na relação com os empresários, foi possível para o setor evoluir internamente.
Por outro lado, no mercado internacional a demanda externa, acompanhada da recuperação dos preços das commodities, foi responsável para que houvesse estímulo à produção e contribuiu para a franca performance do setor.
Outras informações a respeito do comportamento da atividade econômica brasileira podem ser obtidas na Tabela 1 adiante.
Das informações pode-se compreender o ritmo de recuperação da economia sob outros aspectos. Mas o principal deles é que se pode afirmar que o ritmo tem se mostrado lento e baixo.
A recuperação tem-se apresentado, portanto, aquém das necessidades socioeconômicas, principalmente se se levar em conta o número oficial de desempregados (12,8 milhões de pessoas) no mercado de trabalho. Isso significa que o desemprego será diminuído gradualmente e de maneira espaçada pelo País. Algumas regiões irão gerar mais emprego do que outras; haverá maior consumo e, dessa maneira, atrairão investimentos, portanto.
TABELA 1 - PRINCIPAIS RESULTADOS DO PIB A PREÇOS DE MERCADO DO
3º TRIMESTRE DE 2016 AO 3º TRIMESTRE DE 2017
Taxas (%) |
2016.III |
2016.IV |
2017.I |
2017.II |
2017.III |
Acumulado ao longo do ano / mesmo período do ano anterior |
-3,8 |
-3,5 |
0,0 |
0,2 |
0,6 |
Últimos quatro trimestres / quatro trimestres imediatamente anteriores |
-4,2 |
-3,5 |
-2,2 |
-1,2 |
-0,2 |
Trimestre / mesmo trimestre do ano anterior |
-2,7 |
-2,5 |
0,0 |
0,4 |
1,4 |
Trimestre / trimestre imediatamente anterior (com ajuste sazonal) |
-0,5 |
-0,7 |
1,3 |
0,7 |
0,1 |
Fonte: IBGE
O gradualismo da melhora da produção agregada nacional se relaciona muito com a incapacidade do governo de cumprir com o seu papel de gerador de empregos e investimentos neste momento. Com as finanças em déficit e dívida interna elevada, o setor público já não tem condições de ser o agente protagonista da retomada do crescimento.
Por causa do desequilíbrio nas contas, sobrecarrega o setor privado por meio da carga tributária pesada, seguida também do ônus burocrático. Além disso, o crédito pode estar farto para acesso, mas seu custo elevado e as condições para que o setor privado possa oferecer garantias ainda inviabilizam muitos negócios, levando ao atraso da produção diante das demandas do mercado e de um parque industrial com dificuldades para renovação de estoques e equipamentos, o que se traduz no curto prazo em dificuldades de vendas, e lá na frente, na perda de competitividade do produto nacional no mercado externo, além, é claro, da prática de preços elevados, também.
Sobre os assalariados, a carga tributária também pesa bastante, afetando as decisões de consumo e poupança dos consumidores. Enquanto isso acontece, os juros se mantêm altos; embora a taxa básica da economia apresente tendência de queda, as formas de financiamento do consumo e empréstimos permanecem custando alto para as pessoas.
Mesmo assim, após o ciclo inflacionário de 2015 e 2016 o crédito tem sido um vetor importante para a manutenção do padrão de muitas famílias e complementação dos gastos dos orçamentos domésticos. Uma das formas de se verificar o fenômeno situa-se no elevado nível de endividamento das famílias.
Com a recuperação no mercado de trabalho, o que se tem observado é o ritmo crescente do consumo das famílias. Nada explosivo como se gostaria, pois por outro lado poderia haver pressão sobre os preços.
Sem pressão de demanda, graças à contribuição da agropecuária e à demanda fraca obtiveram-se algumas deflações, e a taxa de inflação vai ficar abaixo do centro da meta neste ano (hoje o mercado estima em torno de 3,0% para 2017).
O cenário de crescimento do PIB com o consumo das famílias e o investimento produtivo da parte das empresas tem sido favorável para estimular novas projeções de recuperação econômica. Tanto que, para o ano que vem, o mercado financeiro acredita que o desempenho do produto interno possa dar um salto, para ficar entre 2,0% e 2,5%. Por força do crescimento, estima-se ligeira elevação de preços, mas nada que comprometa estourar o patamar de 4,5% ao ano – uma vez que dificilmente ter-se-á pressão de demanda, mesmo que o emprego cresça.
De um modo geral, as vendas domésticas no momento crescem em relação aos meses anteriores; e em relação a 2016, encontram uma base de comparação deprimida. Assim, olhar para a frente é recomendável, pois qualquer resultado positivo segue sendo muito bem-vindo diante dos acontecimentos do biênio 2015 e 2016.
Na esteira das boas notícias, a previsão para o Natal do corrente ano. A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) mais uma vez revisou para cima a previsão das vendas para os dias de festas de fim de ano, em sintonia com os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) e do PIB. De 4,3% ascendeu para 4,8%. Seguramente será o melhor período para o comércio desde 2014, quando a crise começou a grassar a economia nacional.
Além das lembrancinhas, outros tipos de presentes de baixo valor têm caracterizado os últimos fins de ano festivos. Então, com a ligeira melhora da economia é de se esperar maior volume de vendas no segmento de vestuário e de hiper e supermercados.
Em linha, variações positivas poderão ser encontradas também nos segmentos das livrarias e papelarias, bem como nos de eletrodomésticos e eletrônicos e celulares. Nesses segmentos, os consumidores encontram preços competitivos; muitas ofertas, descontos e promoções; e por meio do crédito podem esticar o pagamento sem maior comprometimento no orçamento, desde que as parcelas não pesem nem prejudiquem o consumo no futuro próximo. Em janeiro chegam outros compromissos a arcar com novos preços, majorados, como condomínio, material e matrícula escolares, mensalidade do clube, IPVA e serviços residenciais, entre outros itens.